Esperança em Tempos de Apostasia - Parte 13

Nesse tempo, muitos serão escandalizados, e trair-se-ão uns aos outros, e uns aos outros se aborrecerão. E surgirão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor de muitos se esfriará. [Mateus 24:10-12]


Temos aprendido que as tribulações servem a um bom propósito, e que os verdadeiros Cristãos devem esperar por tribulações, porque é impossível haver conformidade entre o Cristão e o mundo - o Cristão não fala da mesma forma que os ímpios [Zacarias 8:16; Tiago 2:12, 4:11; 1 Pedro 3:15], não se veste da mesma forma que os ímpios [1 Pedro 3:3,4; 1 Timóteo 2:9], não tem as mesmas preocupações dos ímpios [Mateus 6:25-34], em suma, em tudo ele contraria o procedimento comum daqueles que estão ausentes de Deus e em tudo denuncia que há irreconciliável separação entre as obras da carne decaída e as obra do espírito redimido. Agora, não pensemos que a aflição e a perseguição, embora operem o bem do Cristão, o fazem de forma imediata e visível para toda a Igreja. Não há dúvidas que os eleitos do Senhor são aperfeiçoados pelo sofrimento, por causa do Espírito que a eles assiste e ensina, por causa da Palavra que o Espírito inspira e ilumina, pelo eterno desígnio de Deus em santificá-los e pelo amor ao Senhor que lhes foi gravado na alma. Contudo, há também prejuízos temporários, visíveis, especialmente a aparência da Igreja, os quais podem demorar ainda a se revelarem benéficos para os Santos; porque a Cruz é uma ofensa para todos quantos não são verdadeiramente chamados pelo Senhor, e isto os levará:

1) À Apostasia, ou seja, ao abandono do ensino bíblico. A perseguição, a aparente derrota, a fraqueza, e tudo o mais que remonta à Cruz, são pedras de tropeço para aqueles que não têm o coração totalmente em Cristo. Nos dias de hoje vivemos em tempos de Apostasia, como efeito das tribulações e perseguições que a Igreja sofreu nos séculos XIX e XX - principalmente perpetradas pelos adeptos do modernismo, materialismo, humanismo, pós-modernismo e demais filosofias e subdivisões filosóficas centradas no homem; as quais, com a multiplicação do conhecimento e da informação, pelo endeusamento do conhecer e dos meios de conhecimento, se propuseram entremear à alma e a Revelação, tentando impondo condições as mais diversas (e ímpias) ao conhecimento de Deus pela Escritura. Reitero, portanto, que as perseguições, essencialmente políticas, econômicas e sociais, sofridas pela Igreja , cujos arautos foram tais filosofias acima citadas, geraram a Apostasia. Quanto ao gênero deste afastamento da Doutrina Bíblica, especificamente posso nomear o Liberalismo Teológico, o NeoLiberalismo, o Ecumenismo, o NeoCalvinismo e o Misticismo (Darbista, Quaker, Oriental ou Pentecostista) como frutos teológicos do mau fermento filosófico. Ora, veja que é isto de tal maneira: pressionados nestas perseguições, os Apóstatas, para que não sejam afligidos com os demais integrantes da Igreja, tomam um de dois caminhos - ou renegam a Fé, associando-se abertamente com os inimigos; ou alteram a Fé, eliminando de seu escopo aquelas doutrinas e ações que mais ofendem o mundo e despertam a ira das nações, ou exacerbando as que mais fazem frente ao presente ataque (ainda que às custas de mentiras). Quantas das congregações de nossos dias cantam os Salmos, como fez a Igreja Cristã em todos os séculos e como a Escritura nos ordena? [Efésios 5:19; Colossenses 3:16] Quantas das congregações de nossos dias rejeitam o uso de instrumentos musicais no culto (porque tais instrumentos pertenciam ao culto no Templo, ao sacerdócio Levítico, como o incenso e outras especificidades cerimoniais) [1 Crônicas 25:1-6; 2 Crônicas 5:12;9:11; Neemias 12:27; Salmos 137:1-4], como também os rejeitavam os Reformadores e Puritanos, e os antigos Cristãos, e como nos ensina a Escritura? Quantas das congregações de nossos dias seguem suas Confissões de Fé, usam seus Catecismos, e reconhecem a Fé Cristã Histórica, mesmo em suas doutrinas mais simples e basilares, como a doutrina da suprema autoridade da Escritura? [2 Timóteo 3:16]. E quantas pregam a Palavra da forma com a Escritura comanda - com dura repreensão do pecado, com aplicação das doutrinas bíblicas, com o devido respeito pelo contexto, com solenidade e temor? E quantas rejeitam o ministério feminino, a teologia da prosperidade e o pelagianismo? Antes, todas estes erros aqui numerados se tornaram tão comuns que há mais estranheza quando falamos do que é correto e bíblico, do que quando se ensina e pratica o erro. Ora, o afastar-se daquilo que a Igreja, seguindo a Escritura, praticou e defendeu em todos os séculos, e o aproximar-se daquilo que sempre foi condenado (porque contraria a Escritura) é Apostasia; e somente a Graça de Deus em Cristo Jesus pode nos impedir de cair como todos tem caído, e pode, ao contrário, nos incitar para corrigirmos, com arrependimento, quaisquer erros que ainda estejamos cometendo e combater o mal que ainda toleramos. Vivemos em tempos de Apostasia, e tais tempos começaram com perseguições. Não desprezo, contudo, a influência dos grandes eventos e aflições mundiais nesta Apostasia (como as duas grandes guerras e as recessões), como também não nego que, sejam nas causas imediatas ou nas mais distantes, ou seja na própria Apostasia, a mão poderosa do Senhor esteja agindo. Assim, conforme os motivos aqui expostos, vemos que a perseguição, as aflições e tribulações fazem aflorar os falsos mestres e falsas doutrinas com temporário prejuízo para a Igreja Visível, e, muitas vezes, com uma grande e notória confusão; entretanto, confiamos no Senhor nosso Salvador, que por estes que saíram de entre nós, não eram de nós, e que, quando este tempo determinado houver passado, a Igreja emergerá purificada e fortificada.

Nesta porção dos Evangelhos que examinamos, vemos que foi também um tempo de Apostasia aquele do nascimento da Igreja Neotestamentária; um tempo em que a Igreja dos Judeus estava em Apostasia (porque adicinaram mandamentos de homens à Lei de Deus e renegavam ao Senhor Jesus Cristo - e, portanto, ao que Deus prescrevera na Velha Aliança que eles achavam honrar), e um tempo em que, pelas sucessivas tribulações, mesmo a Igreja NeoTestamentária sofria seus Apóstatas (judaizantes, gnósticos, nicolaítas, etc). Também naqueles dias, haviam homens estavam conosco, mas partiram de nós, porque nunca foram verdadeiramente nossos [1 João 2:19]. Quanto a isto advertiu nosso Senhor aos discípulos na profecia que aqui analizamos: que com as tribulações e perseguições, os traidores e impostores seriam expostos (porque renegam e negociam a Fé antes de perderam a vida pelo seu Senhor) e muitos se escandalizariam com o fato de que sofrimentos estão apontados sobre o povo de Deus, para os aperfeiçoar, porque não alcaçarão a Coroa da Glória, sem antes carregar a Cruz - exatamente como nosso Mestre fez, abrindo-nos o Caminho vivo que nos permite, pela Graça, participar das aflições dEle pela Igreja.

2) À impiedade - pois é fácil professar a Cristo sob a luz do sol, quando somos benquistos pela nossa religiosidade e nenhum sacrifício é feito pela Fé; quando a sociedade cristianizada considera a religião como somente mais uma das boas coisas a se fazer para o bem do próximo, e alguns exercícios moderados de piedade são incentivados e aplaudidos por todos; mas, quando as trevas de uma tempestade se aproximam, e o Nome de Cristo se torna sinônimo da inimizade com o mundo; quando sacrifícios tem de ser feitos e os olhos têm de serem abertos para a miséria de nossos irmãos e para a desgraça daqueles que não conhecem a verdadeira Religião; quando não há ocasião para disfarçar a prática da piedade, e as frontes se enrugam para aqueles que buscam agradar ao Senhor, então até mesmo a mais fraca profissão do Nome de Cristo se torna rara e aquilo que o Senhor tem por bom, mas o mundo tem por mau, é desprezado; pois aos ímpios importa agradar ao mundo e não a Deus. Quantos Cristãos vemos hoje guardando seriamente o Dia do Senhor? E quantos temos visto exercendo a autoridade ordenada na Palavra sobre suas esposas e filhos e, com a devida autoridade e poder, sob a Aliança de Deus, conduzindo sua família sob a lei da Aliança da Graça? Quantos temos visto que se vestem de forma modesta e decente, que falam de forma contida e cuidadosa, que gastam suas posses buscando o bem alheio e que afastam-se dos entretenimentos do mundo para remir o tempo? Desobedecer ao que o Senhor estabeleceu em Sua Palavra é impiedade. Por mais, quando a tempestade finalmente chega, e o desejo de perserguir a Igreja é francamente manifesto, e os homens, como rios de água que brotam da boca do Dragão Satanás, saem à caça daqueles que amam ao Senhor, então, como uma doença malígna, a impiedade alia-se a crueldade e se tornam a regra; todos se tornam suspeitos uns para com os outros e inimigos multiplicam-se mesmo dentre os mais próximos familiares. Assim foi visto ocorrer nos países Comunistas há algumas décadas atrás (como em alguns rincões até em nossos dias), e, para citar novamente a Ilha da Madeira, tal arroubo de ímpia malignidade foi visto pelo Rev. Kalley em seus dias, quando populações inteiras eram incitadas pelos arautos do AntiCristo à destruição dos Calvinistas - o que, por fim nos mostra como a Apostasia e a Impiedade caminham juntas, sob uma mesma influência pecaminosa.

Isto também os discípulos logo conheceram e experimentaram em seus dias, conforme a Profecia de nosso Senhor. Traições e ódio, marcas de quem tem o Diabo por Pai, cresciam mais e mais enquanto se aproximava o dia em que a Igreja NeoTestamentária seria revelada em Cristo Jesus. Ainda nos últimos dias da Igreja Judaica, os traidores avultavam-se; as facções multiplicavam-se; as disputas cresciam. Os Judeus vendiam uns aos outros para defender suas visões políticas e religiosas; e logo, tomando os Cristãos como uma facção útil para ser odiada, logo estenderam e multiplicaram suas impiedades também sobre estes; o que, igualmente, fizeram os pagãos.

3) Ao Esfriamento, pois, quando a impiedade se multiplica e a Igreja diminui em sua influência e em sua visibilidade, então, a imoralidade consome os homens e o amor de muitos esfria, perdendo a Esperança de que o Senhor venha a trazer luz, novamente, sobre o Seu Povo. Sim, infelizmente é comum que pela multiplicação da iniquidade, pelo mal ensino e destruidor testemunho dos falsos mestres e de suas falsas igrejas, pela destruição na alma que é causada por um "outro evangelho" que, em verdade, não é Evangelho algum, por todas estas coisas, o amor de muitos esfria, e o seu zelo se vai, e o desejo e a batalha por uma Igreja Pura e correta segundo a Palavra, por um Povo Santo e cheio de boas obras, enganosamente parece uma perda de tempo. Quantos, dentre os discípulos, se escandalizaram com a tribulação, quantos não suportaram que a Igreja de Cristo fosse vitoriosa em espírito, mas nem sempre em número e visibilidade? Quantos acharam o discurso de nosso Senhor "muito duro" e pensaram que ninguém suportaria cumprir o que Ele exige? Graças ao Senhor e toda glória seja a Ele, porque Ele edifica e preseva Sua Igreja; Ele consola e dirige os Seus para que o zelo e o amor de Seu povo encontre, ainda que nos tempos mais difíceis, amparo e vida na Palavra.


Tendo, agora, observado mais estes versículos da Profecia vemos que, ao contrário do que muitos gostariam, há menos mistério nestas palavras e, sem dúvida, mais piedade, mais enunciação dos deveres Cristãos, mais exaltação da Glória de Cristo. Não há nada sobre nosso futuro, nada sobre o que esperar para nossos filhos ou os filhos de nossos filhos; nada, exceto aquilo que se pode esperar de cada Cristão em cada geração - que haverá muitas batalhas e dificuldades, que estreita é a porta e estreito o caminho que conduz ao céu; e que tal caminho não poderia ser trilhado por alguém cuja natureza permanece em pecados, mas somente por aqueles que, pela Fé somente, pela Graça de Deus, foram transformados e receberam, mediante o ouvir da Palavra, poder do alto, dos céus, para viverem de forma Santa, em franco contraste e desafio àquilo que o mundo considera desejável. E, o que para nós é a realidade de dois mil anos de Igreja, para os discípulos era o desvelar de um novo mundo, pois o velho mundo logo se desfaria em chamas, trazendo à lume a plena realidade da Igreja. Esta plena realidade que aqui contemplamos, universal em lugar de nacional, espiritual em lugar de política, era uma grande novidade para a mente daqueles homens. Portanto, esta Profecia lhes falava ainda mais profundamente do que nos fala e, sinceramente, se a maravilhosa realidade da Igreja e os deveres aqui expostos de mortificação e de consagração obtidos deste texto, não te movem em nada - preocupa-te, porque falta a vida em sua alma; preocupa-te muito, porque podes estar separado do Inferno por apenas poucos passos, e em risco de precipitar-te no Abismo sem fim tão logo sua vida se encerre em um instante.


Porém, para todos quantos têm contemplado ao Senhor e o conhecem; e para quem o busca e deseja conhecer, aprendamos, por fim, como Deus suscita Sua Glória pela tribulação e sofrimento de Seu Povo:


1) A perseguição e a tribulação trazem notoriedade para o povo de Deus; muitas atenções se voltam para aqueles que seguem o Caminho têm, suas vidas observadas minuciosamente, motivos são buscados para os difamar - e quando os inimigos vêem somente o bem em suas vidas, quando a perseverança na Fé e no Amor de Cristo demonstra a certeza das promessas de Deus, então o Nome do SENHOR é glorificado, e a verdadeira religião exaltada grandemente. O povo de Deus é transformado por Ele em um testemunho vivo do poder do Altíssimo [Lucas 21:13]. Muitos, ainda na época dos Apóstolos, quando se cumpriu o que foi predito no Dirscurso Profético de nosso Senhor, foram atraídos à Palavra pelo silencioso e fiel testemunho dos Cristãos que, mesmo sob perseguição dura, mesmo sendo lançados às feras e torturados publicamente, mantinham-se mansos e resolutos, amáveis e corajosos; oh, que belo testemunho os discípulos nos legaram; e quão grande a nossa vergonha que, sendo perseguidos de uma forma que ainda não é física, não demonstramos a Fé que professamos.


2) A perseguição e a tribulação fazem a Palavra ser divulgada entre os perseguidores; diante de reis e tribunais, e diante do povo quando a situação permite. Quão precioso foi o testemunho dos mártires da Reforma na Inglaterra, e como impressionaram seus inquisidores, torturadores e o público de suas execuções com discursos firmados na Escritura, com um claro e poderoso anúncio do Evangelho, com pias orações e conversas. Em tudo o Senhor os assistiu e, em lugar de desespero e blasfêmia (como é comum entre os Apóstatas mesmo ante a menor tribulação) apresentaram palavras cheias da Sabedoria que vem do alto.


Tomemos, pois, todas estas coisas como exemplos, e nos exercitemos em toda piedade e em toda a Sã Doutrina; não negociemos nossa Fé, nem nos rendamos ante às pressões da sociedade; não diminuamos as exigências que o Senhor faz, não neguemos os preceitos da Aliança. E não nos desesperemos por causa das tribulações, da Apostasia, do amor de muitos que esfria e da impiedade generalizada; porque o Senhor tem preciosas promessas: Ele nos sustentará mesmo ante as mais malignas gerações, Ele fará fiel o nosso testemunho, Ele suscitará (e tem suscitado) para Si aqueles que O obedeçam e preguem o Evangelho, sofrendo por isso mesmo grandes perdas, e entregando tudo o que tem por amor ao grande tesouro que encontram em Cristo Jesus, nosso Salvador e Rei.